Lendas:
Um ceramista japonês tentou por toda sua vida conseguir um esmalte vermelho – sem sucesso. Certa noite, enquanto acompanhava mais uma fornada, o desalento tomou conta de sua alma. Escreveu aos filhos uma carta onde se despedia – não queria mais viver, não agüentava mais a dor do fracasso. Jogou-se então ao fogo. Quando na manhã seguinte o forno foi aberto, as peças cerâmicas eram de um vermelho estonteante. Descobriu-se então que o fosfato tricálcico (cinza de ossos) era a chave, o ingrediente que faltava para os vermelhos.
Na China antiga, uma mulher vivia de sua cerâmica. Ofertou ao imperador um lindo copo para vinho de cor vermelha, o único que havia conseguido fazer em toda sua vida. O imperador apreciou o presente e mandou-a fabricar outro igual. A ceramista tentou muitas vezes repetir o feito e falhou. Por fim, lançou-se ao forno quando o prazo para a entrega estava terminando. Quando o forno foi aberto uma linda peça, com um raro vermelho, foi encontrada. Deduziu-se então que os ornamentos de metal que ela usava, como se confirmou mais tarde, deram à peça aquela cor. Daí veio o uso do cobre nesses esmaltes.
Lendas à parte, – nós ceramistas somos desafiados a buscar essas maravilhas e suas transformações. Quando admiramos um vermelho de alta temperatura pensamos: que esmalte será esse? De magnésio, de ferro, de manganês ou cobre? A que temperatura terá sido forneado? Qual será o segredo?
Em relação aos vermelhos isso nos ocorre. Serão mesmo de alta temperatura? Será possível fazê-los?Os vermelhos podem produzir superfícies estonteantes – a vibração e variedade dos tons nos deixam encantados. São muito sensíveis à temperatura e muito afetados quando mudamos qualquer matéria prima usada. Não teremos vermelhos se mudarmos isso ou aquilo.
Hoje eu compreendo a dificuldade com que a cerâmica antiga foi produzida. Os antigos ceramistas usavam pequena variedade de materiais, que havia disponível, chegando a combinações perfeitas. Baseados na experimentação e no erro, descobriram esmaltes maravilhosos, como tinham que ser.
Quando comecei a estudar os vermelhos, sabia que seria por um longo tempo até obter algum resultado mas, mesmo que demorasse muito, eu não iria me lançar ao fogo, iria persistir. Cheguei a desenvolver mais que uma centena de receitas, que me poderiam trazer um vermelho. Para combinar variedades de argilas e matérias primas, elas se reproduziram e geraram outra centena. Analisando as porcentagens das receitas originais forneadas em diversas temperaturas, inserindo variações conforme conseqüências em superfície, cor e derretimento, vi que as opções continuavam a se multiplicar. Para realizar corretamente esse processo selecionava as argilas que me davam melhores resultados – alguns deles bons – apostava nas condições que trariam uma cor mais profunda com melhoras na superfície. Neste jogo, já são centenas de receitas a serem testadas. E assim, vou realizando cada uma delas almejando chegar a vermelhos, que eu consiga repetir.